quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Mishpatim e a virtude da paciência.


Na parashah de Mishpatim, começamos a ver os estatutos (tradução da palavra hebraica Mishpatim) que o Eterno deu aos filhos de Israel. Sabemos que são 613 mandamentos, relacionados a vários aspectos da vida judaica, mas nem tudo é tão simples assim como parece. Por exemplo: Moshê subiu ao monte Sinai, e de lá desceu com as tábus da lei (10 mandamentos) e com  o livro da lei (êx 24:7) e o povo começou a cumprir a Torah, como havia prometido, na famosa frase: "faremos e obedeceremos" (Êx 24:8)?
 
A verdade é que, assim como a constituição de um país leva anos para ser elaborada, e até que o povo tome conhecimento e a lei seja aplicada, não foi coisa de minutos e Moshê desceu com toda a lei ao povo israelita que perambulava pelo deserto.
 
Toda a parashah de Mishpatim é interessante, e o sábio deve aplicar-se a aprofundar no conhecimento e derivações de cada mandamento ali expressado, mas vejamos os versos finais, do Maftir:
 
Êx 24:15-18 - “ Subiu Moisés ao monte, e a nuvem cobriu o monte. E pousou a honra do Eterno sobre o monte Sinai, e cobriu-o a nuvem SEIS DIAS; e chamou a Moisés no SÉTIMO DIA, do meio da nuvem. E a aparência da glória do Eterno era um fogo consumidor sobre o cume do monte, aos olhos dos filhos de Israel. E entrou Moisés pelo meio da nuvem e subiu ao monte, e esteve Moisés no monte QUARENTA DIAS E QUARENTA NOITES.”
 
Moisés havia ido até ao Monte (antes de subi-lo) com Josué, Arão, Nadabe, Abiú e mais setenta anciãos de Israel. Daí só Moisés sobe. Uma vez lá, porque Deus não lhe apareceu de uma vez? Mas não, teve uma nuve, que ficou seis dias cobrindo o monte, e só no sétimo dia é que Moisés foi chamado. Por fim, ele ficaria ali quarenta dias seguidos, para depois descer ao povo.
 
São várias liçoes que podem ser tiradas disso tudo. Por exemplo, o povo estava lá, esperando. Será que não poderia ser mais rápido o processo? Por quê fazer um povo, homens, mulheres e crianças esperarem todo esse tempo?
 
Imagine Moshê lá no alto da montanha e vem uma nuvem e nada, fica lá, parada por uma semana. Que angústia não?
 
Isso tudo contrasta com a pressa que vivemos hoje. Acordamos e já vemos o jornal que praticamente instantaneamente mostra notícias do mundo todo; coisas que estão acontecendo naquele momento.
Daí saímos e vamos trabalhar. Quem utiliza computador, internet, deve se dar conta de que a internet fica cada vez mais veloz e entretanto, isso parece não ser suficiente.
Lembro-me que há não muitos anos atrás, a internet discada era o que havia, e todos exercitavam a paciência diante daquele barulhinho que o computador fazia ao discar.
É um enorme constraste com a velocidade de hoje em dia, em que um filme em alta definição demora menos de meia hora para ser feito o download, e ainda assim ficamos bravos pela "lentidão".  Não por acaso, desaprendemos a apreciar as coisas.
Antes almoçavamos, apreciávamos o gosto dos alimentos; hoje, engolimos algo num fast food. Antes, viamos nossos filhos nascer, curtíamos cada dia, cada fase da infância deles, havia tempo para brincadeiras; hoje, quando vemos, nossos filhos já estão adolescentes e logo saem da casa.
 
O que Moshê teve não foi meramente paciência, mas uma oportunidade de desfrutar de quarenta dias com D-us, no alto de uma montanha. E é isso que precisamos.
Se o estudo da parashah demora mais de 50 minutos, não se desespere para ir embora, desfrute do aprendizado. Se as rezas demoram, não reclame, reze!
 
A bíblia diz em Eclesiastes, num texto muito conhecido: "Há tempo para todas as coisas, todo o propósito debaixo dos céus"
 
Todos pedimos coisas a D-us em nossas preces. Todos temos ansiedade para que algo chegue a nós logo, mas que tal exercitar a paciência e a contemplação?
Israel, todo um povo no meio do deserto e Moisés lá, no alto do monte, no meio de uma nuvem... haja paciência.
 
Se aprendermos a esperar, a confiar no tempo de D-us para nossas vidas, contemplaremos as bênçãos de D-us sobre nós. Mas por outro lado, os apressados nunca atingirão a plenitude com o mérito de terem esperado pelo tempo de D-us. Paciência!

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Um povo livre - Yitro



Antes de entrar no texto da parashah de Yitro (Ex 18 a Ex 20), é interessante fazer uma breve contextualização histórica.
Israel havia habitado por séculos no Egito, onde, após a morte de José, e com o surgimento de uma nova liderança, um novo faraó, o povo hebreu acabou se tornando escravo e logo se habituaram com essa situação. Só que com o passar do tempo, pediam a D-us por um libertador. E o Eterno enviara a eles Moshê.
Pouco antes da libertação final, vale lembrar que “houve uma negociação” entre faraó e Moshê, que desejava que seu povo pudesse sair e livremente adorar ao Eterno.  Mas porque os israelitas precisavam ser livres para adorar? Não podiam simplesmente continuar sendo escravos  e adorar a D-us assim mesmo? O fato é que não é possível. E agora entramos no contexto.
Nessa parashah, com os dez mandamentos, os israelitas, finalmente livres, começam a receber as leis do Eterno.
Só um povo livre pode ter condição de legislar e ter sua própria constituição. A Torah só poderia ser entregue a Israel depois que eles saíssem do Egito. A principal luta do povo de Israel era e continua sendo pela liberdade, pois só através dela podemos servir ao Eterno.
Qualquer trabalho (emprego) hoje não nos isenta de cumprirmos a Torah. Por isso, hoje, também devemos buscar nossa “liberdade”.
Uma das diferenças entre gentios e judeus reside no fato de que o gentio se questiona: “eu preciso fazer isso para ser salvo? Isso é ponto de salvação?” Já os judeus estão preocupados em “como faço para agradar melhor ao Eterno?”
Ao saírem do Egito, o Eterno propiciou aos israelitas a oportunidade de servi-Lo com liberdade, sem restrições. Foi aí que se revelou o caráter de todos. Na liberdade. Nem todos estão dispostos a “servir ao Eterno” com intereza de coração.  E assim o é até aos dias de hoje.
Entre a segurança de um bom emprego, salário em dia, e o pão garantido sobre a mesa, e a liberdade para buscar seu próprio trabalho e poder servir melhor ao Eterno, mas sem garantias de salário, as pessoas preferem a segurança.  Ocorre que, quando optamos pela “liberdade”, exercemos a confiança, a fé, a dependência de D-us.
Para quem deseja se “converter” e unir-se a Israel, é preciso primeiro se desvencilhar do Egito e buscar sua liberdade, para aprender a confiar em D-us. Vejamos o exemplo de Israel: No Egito, eram escravos, mas tinham suas casas, alimentos e viviam “tranquilos”. Ao sair dali, para um lugar desconhecido, o que os esperava? Será que teriam terras, teriam alimentos? Não por acaso, logo que saíram, muitos já se queixaram pedindo por comida, com saudades dos melões, dos alhos, “onde comiam a fartar no Egito”.  É preciso coragem e ousadia para alcançar a liberdade plena.
Imagine-se como escravo no Egito. Você acha que o faraó permitiria aos milhares de escravos israelitas que tirassem o shabat para buscar ao Eterno? E que cumprissem os yamin tovim? Isso sem contar qualquer outro aspecto dos 613 mandamentos.
E por falar em 613 mandamentos, de certa forma todos eles estão contidos nos chamados 10 mandamentos (ou 10 palavras)
Vejamos um pouco dos 10 mandamentos:
- Os 3 primeiros são relativos exclusivamente ao Eterno.
- O 4º mandamento, do shabat, tem relação com D-us e os homens.
- Os outros 6 mandamentos estão vinculados ao próximo (aos homens).
Não por acaso a somatória de 3+1+6 tem como resultado 10. De qualquer forma, quer sejam os 613 mandamentos, quer sejam os 10, de forma resumida, só seremos capazes de cumpri-los se formos um povo LIVRE.
Não coloque impecilhos para obedecer à Torah. Se você deseja servir ao Eterno de coração, busque a sua liberdade; aprenda a confiar em D-us e a alcançarás.


domingo, 12 de janeiro de 2014

Beshalach e as mulheres exemplares de Israel



Estudar as parashiot traz sempre uma oportunidade de novos aprendizados e cada líder traz uma abordagem diferente. Isso é especial! E eventualmente, durante a leitura da Torah, eu me pego fazendo exercícios para a mente, tentando encontrar novas perspectivas sobre o texto da semana. Isso é bom, nos leva a uma busca mais aprofundada sobre um ou outro verso e quem sabe, um pensamento nosso, possa ajudar a aprimorar o estudo naquele shabat?!
Nessa semana, a parashah de Beshalach falava sobre a saída do Egito, e quando os israelitas finalmente saem e veem seus inimigos perecerem no mar, Moshe e o povo entoam um cântico alegre exaltando ao Eterno. Também na haftarah, depois do inimigo ter sido derrotado, Débora e Barak entoam um cântico. E deve ser assim mesmo: sempre quando vemos alguém cantando já logo nos damos conta de que a pessoa está alegre. Talvez por isso mesmo Tiago dizia: “Está alguém contente? Cante louvores.” (Tg 5:13)
Em ambas as situações, tanto com Moshê, como com Barak, a participação de algumas mulheres foi fundamental (Mirian e Jael).
Nossos sábios já diziam que as mulheres possuem em si mais espiritualidade, uma relação mais próxima com o Eterno e por isso mesmo, elas são mais emotivas, sentem a D-us de uma forma mais especial. Isso não deve jamais ser desprezado, e bem verdade, é feliz o homem que sabe valorizar essa espiritualidade da esposa, a começar pelo momento especial em que ela acende as velas do shabat, e traz a luz da santidade desse dia pra dentro de casa.
Embora Mirian não seja uma personalidade de grande destaque na Torah, ela é digna de reconhecimento, e o Eterno diz: “Pois te fiz sair da terra do Egito e da casa da servidão te remi; e enviei adiante de ti Moisés, Arão e Mirian.” (Mq 6:4).
Ela foi uma das figuras fundamentais para Israel durante a história do Êxodo do Egito, e ao ser colocada pelo próprio D-us como enviada ao lado de Moshê e Arão, o Talmude afirma ser ela um dos “três bons sustentáculos” para a libertação do povo. (Taanit 9a)
Na parashah de Beshalach lemos: “Então, Miriã, a profetisa, a irmã de Arão, tomou o tamboril na sua mão, e todas as mulheres saíram atrás dela com tamboris e com danças. E Miriã lhes respondia: Cantai ao SENHOR, porque sumamente se exaltou e lançou no mar o cavalo com o seu cavaleiro.” (Êx 15:20,21)
Mirian tinha o espírito de liderança, pois as mulheres imitaram seu ato e todas saíram atrás dela com tamboris e danças. Isso é fantástico! As mulheres israelitas talvez não imitariam a Moshê, não cantassem, mas tão logo Moshê começou a cantar, sua irmã despertou nas mulheres o desejo de sair dançando atrás dela em exaltação ao Eterno.
O cântico de Moshê, por mais belo que fosse, talvez não transmitisse, por si só, toda a alegria daquele momento, toda a gratidão ao Eterno; era preciso algo mais, e quem trouxe esse algo a mais foi Mirian, com seu exemplo contagiante.
Além disso, “chama a atenção o fato de as mulheres terem tambores. Afinal, quando o povo judeu saiu do Egito, as mulheres não tiveram tempo de preparar nem a massa do pão... Então como foi que deu tempo de levarem consigo tambores?! Convenhamos, este não é, definitivamente, um artigo de primeira necessidade! Nossos sábios explicam que este é um dos sinais da grandeza dessas mulheres: “De onde tiraram tambores e como aprenderam a dançar?” Resposta: estavam tão convecidas dos milagres que D-us faria para o povo judeu no deserto, que levaram consigo instrumentos musicais e prepararam danças para celebrar estes prodígios. As mulheres de Israel sabiam que aconteceriam milagres. Elas se preocuparam com o lado espiritual e não com o material.” (Parágrafos extraído do livro As Mulheres da Bíblia)
Homens são muito práticos, e essa praticidade eventualmente nos impede de sentirmos o espiritual que nos cerca. Por isso o Eterno nos permitiu o casamento, pois nossas esposas nos conectam com o Sagrado e compartilham conosco toda a espiritualidade que elas carregam em seus corações e atos.
Se Mirian foi uma das três pessoas que o Eterno escolheu para tirar Seu povo do Egito, o que podemos dizer de Jael?
Jael (que significa D-us está sobre ela) nos mostra a força e a sabedoria de uma mulher nos momentos de crise. Tal qual ocorrera com os israelitas, que acabaram sendo escravos no Egito, tempos mais tarde, Israel caiu nas mãos do rei de Canaã, chamado Jabim. E lá, eles pediam por um libertador.
Baraque, chamado por Débora para libertar seu povo, ficou receoso, e queria que ela fosse junto. Então Débora disse: “Certamente, irei contigo, porém não será tua a honra da investida que empreendes; pois às mãos de uma mulher o SENHOR entregará a Sísera.” (Jz 4:9)
Coube à Jael a oportunidade de matar o inimigo de seu povo, quando Sísera, já vendo seu exército como derrotado, fugiu, e os homens de Israel não o alcançaram. Então ela, com sabedoria (embora aparentemente fazendo algo errado) o convidou para entrar em sua casa, e depois de tê-lo acolhido, cobriu-o e fez com que ele dormisse para, enfim, matá-lo com uma estaca na testa. (Jz 4:17-24)
As grandes mulheres têm o poder de mudar a história com sua personalidade, e isso acontece através de atitudes excepcionais em situações sempre críticas. Jael era uma mulher virtuosa, obediente ao marido e boa dona-de-casa, mas simultamenamente era uma mulher dotada de forças descomunais; além de corajosa e destemida, características que veem à tona num momento crucial da história de Israel.
Nas grandes histórias de nosso povo, alguns homens tiveram seu nome exaltado, dignos de honrarias, mas assim como Mirian e Jael, muitas são as mulheres que merecem nosso reconhecimento por seu esforço em prol do povo.
Mulheres israelitas de verdade prezam pelo sucesso espiritual de Israel e não buscam o reconhecimento e méritos humanos. Para elas, acender as velas do shabat, trazer a luz da santidade ao interior de seu palácio, de seu lar, é tão satisfatório quanto libertar o seu próprio povo, pois uma mulher que cumpre a Torah com alegria, compartilha da Shechinah Divina com todos (de seu lar, de seu povo e de toda a humanidade)
Que os exemplos de Mirian, Débora e Jael sejam inspiradores à todas as mulheres, e que nós homens, possamos valorizar a cada dia a oportunidade que HaShem nos concede de vermos a Sua luz brilhar em nossos lares através da beleza e espiritualidade de nossas eshet chayil.