A Parashah que dá nome também ao terceiro livro da Torah não
fala apenas de sacrifícios, embora esse seja o assunto principal. Sacrifícios
quase sempre estão ligados ao pecado, mas fingir que não vimos nada, não
sabemos de nada também é considerado pecado pela Torah.
Lv 5:1 “E quando alguma alma
pecar: sob juramento, sendo testemunha de um fato por ter visto ou sabido; se
não o denunciar, levará seu pecado.”
Este texto não nos ensina a
sermos “dedo-duro” mas nos mostra a necessidade de apontar. Denunciar um pecado
nem sempre é sinônimo de perseguição; pode ser um ato de justiça tanto para com
aquele que cometeu o erro, quanto para si próprio, ao livrar a consciência
desse peso.
Denunciar, falar ao juiz é o que
nos cabe; limpar a consciência. O que o juiz vai fazer já não é de
responsabilidade nossa, mas dele. Se o juiz é justo ou injusto (aos nossos
olhos) isso é entre ele e D-us.
Julgar a vida alheia não é
tarefa fácil e o melhor de tudo é que não temos essa necessidade. Por isso, a
sociedade mesma se encarrega de ter seus próprios juízes; a comunidade judaica
tem seu Beit Din, tinha o sinédrio, e isso não os eximia de também cometerem
erros.
Deuteronômio 17 fala do ofício
dos juízes, que deveriam inquerir bem, perguntar bastante, tirar toda
possibilidade de dúvida, de erro, e baseado em no mínimo duas testemunhas,
emitir um julgamento. A Brit Chadashah fala do caso de Estêvão, onde foram
apresentadas falsas testemunhas, mas será que elas foram bem inqueridas?
Por isso é preciso cuidado. Ao
abrir a boca, já emitimos julgamento. E hoje, com facebook rapidamente emitimos
julgamento, a cada postagem, a cada foto que alguém publica. Nem prestamos
atenção mas logo já estamos dizendo que fulano é isso, aquilo, que está
mandando indireta pra esse ou aquele; não acho que uma simples imagem de
facebook seja suficiente para julgarmos o caráter de alguém.
Mas voltando ao texto de Levítico,
é preciso denunciar o erro. Mas e daí?
Daí que Pirkê Avot 1:8 diz: “Não
te constituas em influente de juízes; quando dois contendores estiverem perante
ti considera ambos culpados; mas quando saírem da tua presença, olha-os como
absolvidos, porque já foram julgados. ”
Daí que quando duas pessoas
brigarem, de quem é a culpa? DE AMBOS. E devemos considerá-las assim quando
elas se apresentam diante de nós, mas quando viram as costas, considemo-las
como absolvidos, porque já foram julgadas.
O que isso significa? Que não
devemos ficar o resto da vida marcando uma pessoa. Apontando seus erros do
passado. Devemos libertá-las da culpa.
Shaul HaShaliach foi muitas
vezes ofendido, ficou triste e podemos dizer que teve que corrigir pessoas, mas
veja o que ele diz:
“Porque, se alguém me
contristou, não me contristou a mim
senão em parte, para vos não sobrecarregar a vós todos; basta ao tal esta
repreensão feita por muitos. De maneira
que, pelo contrário, deveis, antes, perdoar-lhe e consolá-lo, para que o tal não
seja, de modo algum, devorado de demasiada tristeza. Pelo que vos rogo que
confirmeis para com ele o vosso amor. E para isso vos escrevi também, para por
essa prova saber se sois obedientes em tudo.” (2 Co 2:5-9)
Se tem uma coisa que aprendi nos
anos de liderança congregacional foi que, quando tinha que disciplinar, que
corrigir a alguém, essa pessoa demandava de mim mais atenção ainda do que todos
os demais. Atenção não era ficar “vigiando” mas “cuidando”. Era um período de
aconselhamento, de cuidado, de tratar as feridas. Isso é o trabalho de um
pastor.
Paulo dizia aos demais: “Não o
tratem mal, mas antes, o consolem (isso não é apoiar o erro, é falar:
levante-se, eu te ajudo) para que a pessoa não seja devorada pela tristeza.
Confirmem para com ela o vosso amor.”
Isso é cumprir o que diz pirkê
avot. “Considera culpado, mas depois de julgar, considera inocente” não fique
perseguindo.
Se todos agirmos dessa forma,
isso só nos trará benefícios, porque foi dito: “com o critério com que
julgardes, sereis julgados; e, com a medida com que tiverdes medido, vos
medirão também” (Mt 7:2)
Como diria o poeta: "Hay que endurecerse, pero sin perder la ternura jamás"
Apontar um erro não é sinal de que sejamos inimigos, mas
ficar cobrando punição, tentando influenciar juizes para condenar alguém, isso
sim é um erro. É se auto-aprisionar em sentimentos negativos.